Miscellanées : Une sémiotique en mouvement

Manipular por contágio*

Eric Landowski
Paris, CNRS – São Paulo, CPS

Publié en ligne le 22 décembre 2021
https://doi.org/10.23925/2763-700X.2021n2.56791
Version PDF

 

 

Introdução : revisitar, rever, reorientar

Faz muito tempo que alguns de nós, semioticistas da geração 68 e, ainda assim, de inspiração estruturalista ou, hoje em dia, “pós-estruturalista”, consagramos parte de nossos esforços à análise de um aspecto da vida política que a ciência política nunca levou muito a sério : o discurso político. Este é um objeto que os cientistas políticos, voltados antes de tudo para o estudo das forças, das instituições e dos comportamentos políticos, deixam aos “linguistas” e aos “semiólogos”. Quanto aos políticos profissionais, ainda que parte considerável da popularidade deles dependa do que tenham a dizer e da maneira como o dizem, a maioria deles não parece muito interessada nas conclusões que especialistas das ciências da linguagem, semioticistas ou outros, possam tirar de seus desempenhos oratórios.

Face a essa indiferença, seria um consolo se o olhar semiótico que dirigimos para a cena política ajudasse à compreensão do espetáculo por nossos concidadãos. Se fosse assim, ao intervir entre os dois polos da comunicação política, a sociedade civil e os dirigentes, cumpriríamos o papel de promotores de uma leitura crítica da vida política. Porém, dada a confidencialidade de nossas pesquisas e a modéstia de seus impactos, tal sonho parece bastante utópico. Isso, provavelmente, deve-se, em parte, à compartimentação entre as disciplinas e à tecnicidade de nossos trabalhos. Mas essas explicações são insuficientes.

Greimas, no fim de sua vida, dizia que a semiótica deveria “ser refeita”. Menos categoricamente, podemos nos perguntar se, para ser mais relevantes e, talvez, melhor entendidos, não deveríamos, no mínimo, rever a maneira como temos concebido a construção de uma semiótica “do” político, ou “da” política. — Masculino ou feminino ? Esta é a primeira questão, talvez a mais decisiva, por colocar em jogo, de imediato, duas opções teóricas bem diferentes.

* Versão corrigida e atualizada (setembro de 2021) de “La politique revisitée : manipuler par contagion”, Versus, 107-108, 2008. Tradução de Emerson Xavier da Silva e Yvana Fechine com revisão do autor.

1. O político, a política — e retorno

Escolher o político seria dar-se por objeto uma das dimensões inerentes a toda vida em sociedade, aquela que concerne às relações de poder, quer dizer, de autoridade, de ascendência, de dominação e, correlativamente, de dependência, de submissão, de respeito, de obediência, de subjugação ou até mesmo de servidão (voluntária ou não) que se estabelecem e, por sorte, também se transformam em função das interações entre os atores, seja qual for o espaço, micro ou macrossocial que se considere (da célula familiar à cena internacional, passando, por exemplo, pela escola, a empresa e, obviamente, o Estado). Mas não foi essa a opção escolhida.

Sem que a questão tivesse sido explicitamente discutida, foi preferida pela maioria uma abordagem mais restrita. Houve rapidamente uma focalização nas produções verbais de um número limitado de atores sociais reconhecidos (com base em critérios semânticos implícitos por serem considerados socioculturalmente evidentes1) como a encarnação mesma da função política : candidatos às eleições, dirigentes e militantes de partidos, jornalistas especializados no tema etc. Deixando de lado a ideia de uma teoria semiótica do político, que consistiria na construção de uma problemática relativa ao funcionamento global da esfera política, a seus princípios gerais, à sintaxe que rege as relações de poder em qualquer contexto, optou-se por uma analítica da política, reduzida aos discursos do Poder — do Poder institucionalizado ou em busca de institucionalização. Daí saiu uma massa considerável de estudos empíricos sobre diversos tipos de mensagens escritas, orais ou em imagens, que os políticos profissionais, assessorados pelos profissionais da mídia, dirigem aos cidadãos com vistas a obter sua aprovação, seu apoio e seus votos : não é isso mesmo o que comumente se chama de “comunicação política” ?

Nesta perspectiva, o empenho inicial consistiu em buscar, sob a superfície dos textos — manifestos de partidos, alocuções governamentais, proclamações eleitorais, artigos de imprensa ou obras de pensadores políticos —, a “arquitetura conceitual” que os organiza, e, a partir daí, empreender a crítica de seus conteúdos doutrinários ou pressupostos ideológicos. A desmistificação e mesmo a “guerrilha semiótica” estavam então na ordem do dia. No entanto, poucos trabalhos memoráveis resultaram desses esforços, com exceção daqueles, inaugurais, dos grandes mestres2. Em seguida, ao mesmo tempo em que a teoria narrativa e discursiva se desenvolvia, os estudos semiopolíticos se orientaram rumo as estratégias actanciais e modais da manipulação e as táticas enunciativas de persuasão utilizadas no debate público3. Desde os anos 1990, constatando que o discurso político busca tanto a tocar a afetividade quanto a mobilizar a “razão” dos cidadãos, alguns, explorando os esquemas da “semiótica das paixões”, derivada da problemática modal já clássica da ação e da manipulação, procuraram dar conta também dos efeitos emocionais ou dos estados “patêmicos” que os protagonistas da competição política se esforçam em suscitar ao “falar para ganhar”4. A isso acrescenta-se a perspectiva que, de nossa parte, buscamos promover desde o fim dos anos 80, chamando a atenção para uma dimensão da interação que as três abordagens precedentes não levam em conta : a dimensão da presença sensível e do contágio estésico entre sujeitos5. Tendo esta proposição suscitado mais resistência do que adesão por parte do establishment semiótico, voltaremos ao tema mais adiante para justificá-lo.

Nesse cenário, a política era considerada como um vasto espaço discursivo e cenográfico no interior do qual aparecem elementos, verbais ou não, que apresentam o estatuto de manifestações significantes que, por natureza, são semioticamente analisáveis. Entre elas, conforme a opção por uma semântica dos discursos políticos instituídos (os da “classe política”), e segundo as preferências de cada um, tal pesquisador escolhia analisar os discursos de tal partido, o outro, tal alocução do chefe de Estado, um terceiro, os cartazes ou os anúncios de propaganda de tal candidato etc.6. No fim das contas, tínhamos uma soma de análises excelentes em si mesmas, mas pontuais e desconectadas umas das outras, sem que a lógica de conjunto, da qual os elementos estudados tiram sua significação, pudesse ser apreendida ou sequer considerada como problema que merecesse ser colocado.

1 Sobre estes critérios, cf. E. Landowski, “Politiser, dépolitiser”, in J.-Cl. Coquet (org.), Sémiotique. L’Ecole de Paris, Paris, Hachette, 1982, pp. 153-156.

2 Cf. R. Barthes, Mythologies, Paris, Seuil, 1957; U. Eco, “Per una guerriglia semiologica”, in Il costume di casa. Evidenze e misteri dell’ideologia italiana, Milan, Bompiani, 1973.

3 Cf. por exemplo F. Marsciani, “I programmi elettorali. Un’analisi discorsiva », in M. Livolsi et U. Volli (éds.), La comunicazione politica tra prima e seconda repubblica, Milano, FrancoAngeli, 1995 ; J.-D. Urbain, “Idiologues et polylogues. Pour une sémiotique de l’énonciation”, Nouveaux Actes Sémiotiques, 14, 1991.

4 Cf. D. Bertrand et al., Parler pour gagner. Sémiotique des discours de la campagne présidentielle de 2007, Paris, Presses de la FNSP, 2007 (cap. 5, “La mobilisation des passions”).

5 Cf. E. Landowski, “Viagem às nascentes do sentido”, in I. Assis Silva (org.), Corpo e Sentido, São Paulo, Edunesp, 1993 ; “Régimes de présence et formes de popularité”, Présences de l’autre, Paris, P.U.F., 1997 ; “En deçà ou au-delà des stratégies, la présence contagieuse”, Passions sans nom, Paris, PUF, 2004.

6 Ver por exemplo H. Quéré, “L’affiche électorale : positions et parcours”, Nouveaux Actes Sémiotiques, 2, 1989 ; I. Pezzini, Lo spot elettorale, Rome, Meltemi, 2001.

Desse modo, adotava-se no domínio político a opção considerada semioticamente pertinente ao que era então o principal campo de aplicação da teoria, os textos literários : “O texto, apenas o texto ; fora do texto não há salvação”. Em função deste princípio, concentrava-se na análise de peças isoladas, tiradas ad libitum da massa de todas as obras previamente reconhecidas como “literárias”, sem que houvesse uma preocupação com as relações e práticas envolvendo os múltiplos atores — autores, editores, livreiros e compradores de livros, críticos e distribuidores de prêmios, redatores de manuais e professores e, finalmente, leitores — que geram dialeticamente o sentido das obras e, antes de mais nada, fixam seu estatuto “literário”. O mesmo aconteceu no campo religioso : profusão de estudos sobre todo tipo de fragmento dos evangelhos escolhidos segundo a preferência de cada um — nada sobre a sintaxe actancial das práticas da fé e dos rituais do culto que, no entanto, fixam as condições reais de leitura destes textos e da recepção pelos fiéis de suas interpretações eclesiásticas autorizadas.

De sorte que foi apenas no âmbito de uma sociossemiótica, considerada por muitos como pouco ortodoxa, que foi possível esboçar uma problemática do modo de funcionamento global destes diversos campos7 enquanto espaços de interação no interior dos quais as manifestações pontuais (inclusive textuais) fazem sentido em função das situações semióticas (e não “extratextuais” ou “contextuais”8) que presidem sua colocação em circulação e sua recepção. O retorno que propomos a uma problemática mais geral, levando em conta as posições e as práticas de discurso e integrando-as numa dinâmica do político, pode, a nosso ver, devolver algum peso aos nossos trabalhos.

7 Sobre o campo religioso e mítico, Cl. Calame, “Récit héroïque et pratique religieuse”, Annales, 61, 3, 2006. Sobre o campo literário, Cl. Calame, Le récit en Grèce ancienne, Paris, Belin, 2000 ; E. Landowski, “Para uma abordagem sociossemiótica da literatura”, Significação, 11-12, 1996. Sobre o campo jurídico, B.S. Jackson, Making Sense in Law, Liverpool, Deborah Charles Publications, 1995 ; E. Landowski, “Une approche sémiotique et narrative du droit”, La Société réfléchie, Paris, Seuil, 1989 ; id., “Estatuto e práticas do texto jurídico segundo uma perspectiva sociossemiótica”, Significação, 14, 2000.

8 Cf. E. Landowski, “Pour une sémiotique des situations”, Présences de l’autre, op. cit. ; “Textes et pratiques”, Passions sans nom, op. cit.

2. Esquema narrativo : a Polis, o Mercado

Quanto mais a semiótica privilegiava a análise textual, mais ela julgava-se capaz de projetar sobre o discurso um olhar “científico”, quer dizer, entre outros requisitos, politicamente neutro. No entanto, aqui se coloca um problema epistemológico particularmente árduo quando se trata de fundar uma semiótica do político (ou, também da política). Isso porque o olhar que projetamos sobre as coisas para recortá-las e construir objetos semioticamente pertinentes já é, em seu princípio, um olhar político9. Por essa razão, para renovar nossa abordagem, é preciso submeter a teoria semiótica da ação e seu modelo narrativo a uma reflexão crítica de caráter indissociavelmente metassemiótico e político, de modo a explicitar, relativizar e, talvez, ultrapassar os pressupostos antropológicos e filosóficos a ela subjacentes enquanto procedimento de construção do sentido.

9 Cf. E. Landowski, “Politiques de la sémiotique”, Rivista Italiana di Filosofia del Linguaggio, 13, 2, 2019.

A opção fundamental que faz a originalidade da semiótica greimassiana e lhe dá sua eficácia enquanto instrumento de análise dos discursos, e também das práticas, consiste na ideia de associar a problemática do sentido a da interação. Ela já estava esboçada desde 1966 em Sémantique structurale, ainda que o termo “interação” esteja ausente neste livro (e raro nos que virão em seguida)10. Esta opção, revolucionária em relação às abordagens linguísticas ou lógicas da significação então dominantes, permanece, a nosso ver, uma ideia genial. Desenvolvida em termos operatórios sob a forma de uma gramática narrativa, ela alimenta ainda hoje o essencial de nossas pesquisas. Portanto, se há algo a ser “refeito” na conceituação da qual somos herdeiros não é isso. — Mas é algo muito próximo : não a narratividade em si mesma, enquanto princípio geral de inteligibilidade, mas uma opção segunda, que, como confessa o próprio Greimas, procede de uma escolha ideológica11. Trata-se do esquema narrativo. Lembremos que ele se apresenta como uma sintaxe da circulação dos objetos entre sujeitos em busca de conjunção com os valores. O conteúdo político latente deste esquema é de duas ordens.

10 Cf. Sémantique structurale, Paris, Larousse, 1966 (reed., Paris, PUF, 2002), particularmente pp. 102, 117 et 172-186. Cf. também E. Landowski, “A borboleta cabeça-de-Janus. A propósito de Semântica estrutural”, in Com Greimas, São Paulo, Estação das Letras e Cores, 2017.

11 Cf. A.J. Greimas e J. Courtés, Sémiotique. Dictionnaire raisonné de la théorie du langage, Paris, Hachette, 1979, p. 247.

Primeiramente, a visão que ele propõe da sociedade é uma visão democrática que lembra a ideia clássica da Polis grega. Cada um está supostamente motivado por uma vontade livre, da qual tem consciência : a “competência cognitiva” do Sujeito, ao mesmo tempo que está voltada para o mundo circundante, permite-lhe, reflexivamente, uma visada sobre si mesmo como objeto de “saber”. Conhecendo e assumindo seu próprio querer, ele o constitui em projetos, em programas virtuais. Na medida em que cada um reconhece no outro uma “intencionalidade” desta ordem, as relações entre uns e outros têm a propensão a serem regidas por acordos entre as vontades, ou seja por contratos cujo estabelecimento passa por procedimentos de negociação : é a “manipulação”, termo técnico mal escolhido por despertar suspeita, quando, na verdade, ele designa o que o pensamento em questão apresenta justamente de mais democrático : o privilégio concedido ao fazer saber e ao fazer compreender, à dialética do “fazer persuasivo” e do “fazer interpretativo” — em suma, à “razão”, antes do recurso à força, inclusive na instauração ou no exercício de relações de poder12.

Mas, por outro lado, o mesmo esquema é interpretável como a expressão de uma visão impregnada de um utilitarismo que tende a reduzir todas as relações sociais àquelas de uma sociedade mercantil. “O que é essencial ao homem, postula Greimas, é a busca (...) dos valores, sua apropriação, sua atribuição etc.”13. Esta perspectiva não contradiz a precedente, mas radicaliza um de seus prolongamentos possíveis : a intencionalidade, que, com seu caráter geral, fundava o sujeito enquanto tal, transforma-se numa busca obsessiva de possessão. E o uso da “razão” se reduz a cálculos interesseiros. É o que resume a fórmula S U O -> S ? O : o sujeito, primeiramente “disjunto”, só poderá se “realizar “graças à “conjunção” com algum “objeto de valor”. Todo o seu percurso se orienta rumo a este fim. Dado que os objetos cobiçados (qualquer que seja sua natureza, modal, pragmática, cognitiva etc.) raramente caem do céu (segundo um “programa narrativo de dom”), é preciso fabricá-los (“programa de produção”) ou criá-los ou, ainda, adquiri-los, quer por roubo, quer por intercâmbio, junto àqueles que os possuem14. No último caso (socialmente recomendado e semioticamente privilegiado), a conjunção se efetua mediante processos de negociação nos quais cada um avalia o “valor dos valores” em jogo conforme uma lógica que, em última instância, é econômica. O mundo torna-se assim o suporte de uma “circulação de objetos de valor” entre proprietários em “estado de conjunção”, que desfrutam de suas posses, e possuidores no estado somente virtual, em busca de apropriação, ou acidentalmente desapossados de seus bens e desejosos de recuperá-los.

12 Sobre a “manipulação” como fundamento do laço social, cf. E. Landowski, Les interactions risquées, Limoges, Pulim, 2005, pp. 83-85.

13 “La soupe au pistou ou la construction d’un objet de valeur”, Du sens II, Paris, Seuil, 1983, p. 169.

14 Sobre os distintos modos de aquisição do objeto, cf. E. Landowski, “Politiques de la sémiotique”, art. cit.

Deste modo, o sujeito da democracia semiótica torna-se um agente econômico e a sociedade, a vida em sua totalidade acabam assemelhando-se a um vasto mercado no qual tudo se cumpre, se vende, se paga. Contudo, se este esquema narrativo é problemático aos nossos olhos, não é tanto pelo que ele propõe ou supõe, mas pelo que ele exclui, razão pela qual acrescentaremos uma modelização complementar que permitirá ver a outra face da narratividade, sua face oculta. Todavia, por ora, constatemos somente que este esquema fornece uma grade de leitura de uma eficácia incontestável. A sintaxe actancial e modal que ele estabelece corresponde perfeitamente a uma grande variedade de processos interacionais, políticos entre outros, cuja lógica subjacente ela permite entender bem.

Ora, se o esquema se adequa tão exatamente ao seu objeto é porque a forma de racionalidade que o articula é, nem mais nem menos, a mesma que, enquanto visão do mundo socialmente compartilhada (em outras palavras, enquanto ideologia), inspira uma parte importante dos comportamentos dos atores sociais ou, pelo menos, serve para dar aos seus atos uma aparência de razão, ainda que seja apenas aos seus próprios olhos. A concordância é tal que se poderia supor que o Sujeito semiótico só foi moldado sob a forma que conhecemos para dar apoio aos mitos justificadores de sociedades divididas, como as nossas, entre o ideal democrático e as leis terrenas do mercado, princípios divergentes que somente uma ideologia individualista permite conciliar, pelo menos formalmente, ao assumir, como regra geral, a ficção de um Sujeito inteiramente racional e livre, tanto como eleitor quanto como agente econômico.

Esta figura de um sujeito de pura razão, na qual cada um pode ser tentado a ver o duplo depurado de si mesmo, é fruto de uma tradição que ultrapassa de longe o âmbito de nossa disciplina. Figura tão mítica quanto o Homo œconomicus, calculador infalível de seus próprios interesses imaginado pelos teóricos do liberalismo econômico, quanto o Homo juridicus que se encontra no âmago da concepção do sujeito de direito em Rousseau ou Kant, ou quanto o Homo politicus dos teóricos da democracia representativa, tal é o Homo semioticus. Ele é o caçulinha dos precedentes e nele se acha a síntese de seus traços : a vontade, a consciência de si, o sentido e o gosto do razoável (a “prudência”). Assim investido de todas as competências requeridas para agir com boa consciência e sempre sabiamente, ele realiza circularmente, por suas ações, o “sentido da vida” escrito por antecipação no esquema de racionalidade que o guia para agir.

Apesar de todas as reservas que se possa fazer, epistemologica ou filosoficamente, contra o caráter logocêntrico da visão antropológica, jurídica, econômica, social e, em última instância, política, que sustenta esta construção semiopolítica, parece-nos difícil não reconhecer que, empiricamente, o regime jurídico-político correspondente, aquele das sociedades civis baseadas na negociação e no contrato, quer dizer, a “democracia”, certamente não é o pior dos modelos possíveis. Se tivéssemos que apontar o pior, teríamos de escolher entre o caos determinado pelo arbítrio de um soberano absoluto e imprevisível — regime da pura contingência para seus súditos — e a ordem totalitária de uma sociedade burocrática inteiramente programada15. Mas, fora destas alternativas radicalmente opostas, existe ainda uma outra perspectiva semioticamente concebível, outra maneira possível de pensar o ser do sujeito no mundo e, visto que se trata do sujeito semiótico, outros modos de conceber sua presença em um mundo que faça sentido, por exemplo, politicamente.

15 Cf. “Politiques de la sémiotique”, art. cit.

3. O que falar quer dizer16 : sob o blablablá, a presença

Da concepção que se tem do Sujeito depende a maneira como recortamos o que supostamente faz sentido aos olhos dos sujeitos de carne e osso e, consequentemente, o que será suscetível de influenciar suas escolhas, políticas, por exemplo. Ora, tudo parece indicar que, na época atual, o discurso dos políticos, enquanto raciocínio argumentativo, está longe de constituir o que prioritariamente faz sentido na política. Para que assim fosse, seria preciso que os destinatários regulassem seu comportamento (eleitoral, em particular) exatamente como faz o Homo semiopoliticus, cujo retrato acabamos de examinar. Mas este retrato é uma abstração que só existe no imaginário teórico do semiótico (e, talvez, no “espaço público” ideal de J. Habermas17).

Na verdade, quem realmente se posiciona, a favor ou contra, em função apenas dos discursos dos homens políticos ? E, antes disso, quem escuta o que eles dizem, quem lê o que eles escrevem ? Salvo alguns efêmeros sucessos de livraria, a literatura política não tem muita audiência ! E nas telas, excetuando períodos eleitorais, não são, em geral, os políticos os que são ansiosamente aguardados nos horários nobres... O fluxo da palavra política é ininterrupto, estorva todos os canais da comunicação, mas, o que dele se ouve ? Fora certas “pequenas frases” que vão direto ao alvo ou algumas provocações que escandalizam, o que lembramos ? “Falar para ganhar”, dizem-nos. Não seria, antes, para ganhar, fazer efeito ? Falem, senhores políticos ! Mas que não seja para dissertar, explicar, argumentar, epilogar, pois os pedagogos (Prodi, Giscard, Rocard, FHC) são raramente os vencedores. Falar, em política, só é válido se a tomada de palavra se fizer ato : ato de presença (no sentido em que um ator possui e manifesta, ou não, uma “presença” em cena), e presença em ato, através de uma fala que não discorre, mas passa autoridade e decisão acertada.

16 Fórmula tomada livremente emprestada de Pierre Bourdieu.

17 Cf. por exemplo J. Habermas, “Au delà du libéralisme et du républicanisme, la démocratie délibérative”, Raison publique, 1, 10, 2003.

Ao longo de uma campanha eleitoral, escolhemos entre os candidatos em função do que eles têm a propor. Mas a maneira como os escutamos, como compreendemos e julgamos os argumentos que eles nos apresentam, e até mesmo nosso grau de disponibilidade para reagir favoravelmente aos estados emocionais que eles querem que compartilhemos, tudo isso depende, como em toda relação de interlocução, do que experimentamos intimamente, simplesmente ao ver e ouvir a pessoa que fala, de como a “sentimos” imediatamente. Ora, por termos visto e ouvido tanto os políticos nas telas, cremos saber o que deles esperar. O que eles dizem pode apenas confirmar o sentimento que já tínhamos do que eles valem no fundo. Esta inflexão em favor do sensível afeta o estatuto, a forma e até mesmo o lugar do político enquanto nível de realidade supostamente significante. Se até um passado recente, para todos, ou quase, a política tinha uma significação, hoje, pelo que mostram as pesquisas, para muitas pessoas, ela perdeu este atributo. Constatamos, no entanto, que ela faz sentido segundo um regime semiótico diferente : entendida como narrativa, a política perdeu sua credibilidade, mas, sentida como uma das formas da experiência, ela recupera sua capacidade de mobilização18.

Há um tempo (antes do digital), para o cidadão médio, a política se situava sobretudo em um espaço assaz longínquo, abstrato, que assumia sua significação através do discurso de um número limitado de detentores da palavra autorizada, jornalistas e políticos primeiramente. Os discursos destes especialistas investidos de uma competência reconhecida tinham bastante credibilidade para dar globalmente um sentido à História, explicar o presente e traçar interpretações plausíveis para o futuro, fazendo com que a vida coletiva parecesse se desdobrar como uma grande narração inteligível e que seus destinatários pudessem nela reconhecer seu lugar, cada eleitor escolhendo, no dia das eleições, entre vários cenários colocados em concorrência. Mas essa estratégia, sozinha, não funciona mais. Não que o público tenha perdido algum dia a capacidade de ouvir discursos da razão e só tenha olhos agora para o visual dos candidatos, mas antes porque uma nova maneira de se viver a política tende a se afirmar.

18 Sobre “narração” e “experiência” enquanto formas semióticas do estar-no-mundo, cf. E. Landowski, “Unità del senso, pluralità di regimi”, in G. Marrone (org.), Narrazione ed esperienza. Intorno a una semiotica della vita quotidiana, Roma, Meltemi, 2007.

A política não é mais identificada exclusivamente aos enfrentamentos postos em cena nessas pequenas epopeias ou grandes utopias que os políticos se sentem, desde sempre, na obrigação de nos contar. Em vez disso, a política torna-se uma relação em ato cujo sentido surge no próprio momento da copresença enquanto relação vivida, quer face a face (raramente), quer por meio de uma mídia. Esta relação é ao mesmo tempo tênue (ela é sentida no instante) e profunda (ela intervém aquém da sintaxe tanto das paixões quanto das razões). Trata-se de uma relação sensível, quase íntima, que cada um nutre ou acredita nutrir a respeito destas figuras públicas que disputam nossos votos. É por isso que queremos que eles não mais se escondam atrás de um suposto saber, que eles não se mantenham distantes ou, pior, acima de nós. O que deles se espera é que se exponham “como eles são” (astúcia enunciativa que não é nova19), que eles corram o risco de uma relação in praesencia, que permita sentir se, sim ou não, eles nos “compreendem”. De maneira bastante inesperada, a política, domínio, segundo dizem, do cálculo e da razão fria (o que, antigamente, levava o nome de “deliberação”), tende assim a se tornar um dos planos sobre os quais a dimensão sensível de nossa relação com o mundo e com outrem vem à tona, traduzindo-se sob a forma de gestos de adesão ou de rejeição à flor da pele.

19 Cf. J.L. Fiorin, As astúcias da enunciação. As categorias de pessoa, espaço e tempo, São Paulo, Contexto, 1996.

Houve na França um exemplo memorável por ocasião do debate entre os candidatos na véspera do segundo turno da eleição presidencial de 2007. Se sua retransmissão durou duas horas inteiras, o momento decisivo foi breve : o tempo apenas de deixar florescer uma bela disputa doméstica. No papel feminino estava a candidata do Partido Socialista. Em várias ocasiões, carente de argumentos, ela atacou pessoalmente seu interlocutor — o que se chama em retórica de ataque ad hominem. Ela, que tinha até então cultivado a imagem de uma virgem inspirada, revelou-se de repente uma verdadeira harpia. Simetricamente, seu adversário, conhecido por suas “fúrias de milico” e a quem atribuíam a brutalidade de um megalômano inculto e sedento de poder, mostrou-se um homem cortês e aberto ao diálogo. Sem nada perder de seu sangue frio diante da provocação nem de sua serenidade diante da ofensa, ele se mostrou aquele que tentava chamar à razão a irascível megera que, frente a ele, tinha assumido o lugar da Nossa Senhora que todos esperavam. Foi nestas condições que muitos eleitores que, até o último momento, hesitavam em escolher o seu campo — eles, que os cientistas políticos qualificam de “voláteis” e cujo voto é sempre, em certa medida, decisivo — só aderiram, ao que parece, às propostas de um ou de outro candidato em função da pura e simples simpatia que o contraste manifesto entre o modo de presença sensível, estésico de um e de outro perante o adversário e a câmera (logo, aos eleitores), podia inspirar imediatamente a favor de um ou do outro — a favor de um e contra o outro, para ser mais exato20.

20 Para uma análise semiótica deste debate em termos de “estesia social”, cf. G. Dandolo, Politica ed esperienza. Il caso delle elezioni presidenziali francesi del 2007, tese, Universidade de Bolonha, 2007.

Isso significa que o que é prioritário se situa além ou aquém da palavra, flatus vocis que se ouve, mas não se escuta. “Além” remete à tomada de posição, à escolha partidária frente ao problema do momento, expressa em termos claros, diretos e concisos, na medida do possível. O resto do discurso é apenas fundo sonoro que corre o risco de virar conversa mole ou, pior, diversionismo, manobra, a ponto de levantar suspeitas. Por se falar demais, fomenta-se o tédio ou a desconfiança, talvez os dois afetos de base da comunicação política, ainda que não figurem na lista das paixões repertoriadas pelos semioticistas especialistas no assunto21. “Aquém” diz respeito à qualidade de um modo de presença ao outro que se manifesta pelo tom, destacado ou implicado, peremptório ou aberto à réplica, severo ou familiar ; pela hexis corporal, tranquila ou agitada, tensa, estrita ou relaxada ; pela postura, altiva ou convivial, seca ou cúmplice ; em suma, pela maneira de estar corporalmente perante o interlocutor22. Estes são exemplos de modulações imediatamente sensíveis da relação intersubjetiva, quer dizer variações estésicas que intervêm num plano mais profundo que as operações modais.

21 Ao contrário, tédio e desconfiança estão no âmago das preocupações dos cientistas políticos, para quem o desencantamento encontra-se na raiz da “crise da política” contemporânea. Cf. P. Rosanvallon, La contre-démocratie. La politique à l’âge de la défiance, Paris, Seuil, 2006.

22 Cf. “La vedette et le bouffon”, Présences de l’autre, op. cit. ; “Diana, in vivo”, Passions sans nom, op. cit.

4. Aquém da aritmética das paixões, a dinâmica do sensível

Até a publicação de Semiótica das paixões, entendia-se que o objeto da semiótica era dar conta das condições de inteligibilidade de nossas relações com o mundo23. Vimos como, nesta perspectiva, o esquema narrativo desempenha um papel chave. Mas, por outro lado, desde 1979, veio a Greimas a ideia de que transpondo a sintaxe do fazer e da ação àquela do ser e dos estados, seria possível estender o campo de pertinência do modelo ao “espaço tímico”24. Não se tratava ainda de afetividade ou de sensibilidade — desejava-se, antes de mais nada, ampliar as noções, até então muito abstratas, de estados “eufóricos” ou “disfóricos” produzidos pelas operações de junção do sujeito com os objetos de valor. Foi somente doze anos depois que surgiu, com este livro, um esquema narrativo bis, não menos canônico que o precedente : o “esquema patêmico”25. Daquele momento em diante, muitos julgaram que a grande questão estava resolvida, isto é, que o semioticista, até então confinado nos limites do “inteligível”, agora tinha os meios para lidar também com o “sensível”. Entretanto, neste ponto, é necessário dirimir um mal-entendido persistente.

É certo que a sintaxe do esquema patêmico permite formalizar, quase calcular as condições para o surgimento de todo tipo de estados “patêmicos”. O sujeito quer e não pode — este é o sentimento de “frustração”. Ele não pode, mas quer mesmo assim — esta é a disposição apaixonada do “obstinado”. E assim por diante. Portanto, temos, sem dúvida, o esboço de uma aritmética dos estados de “alma” ou, mais exato, do espírito. Mas essa combinatória modal não diz nada sobre nosso corpo a corpo direto, sensível e até mesmo sensual com as coisas, com outrem, com nós mesmos. É certo que tratar deste aspecto da experiência não era o objetivo dos autores. Contudo, se a gramática que eles construíram dá conta de certa lógica dos afetos, se ela os torna inteligíveis, não se trata por isso de uma semiótica da experiência propriamente sensível, pelo menos se designarmos com este termo os efeitos de sentido que emergem da relação imediata que mantemos enquanto seres de carne com a materialidade das coisas e a corporeidade das pessoas tais como nós as percebemos sensorialmente em toda interação real.

23 A.J. Greimas e J. Fontanille, Sémiotique des passions, Paris, Seuil, 1991.

24 Cf. A.J. Greimas, “De la modalisation de l’être”, Actes Sémiotiques-Bulletin, 9, 1979 (agora in Du sens II).

25 Cf. Sémiotique des passions, op. cit., p. 66, 85, 170, 175, 179, 180, 265, 270-272 (conforme o índice do volume original em francês).

Ao sensível assim concebido, encontramos as primeiras referências unicamente em outra obra de Greimas, Da Imperfeição, com a aparição das noções de “estesia” e de “acidente estético”. É esta abordagem que, de nossa parte, buscamos desenvolver ao tratar, não de paixões repertoriadas pela tradição (que se prestam efetivamente às descrições modais), mas de “paixões” sem nome, ou seja, de flutuações do sentir que escapam à problemática modal. Se elas não são redutíveis a descrições modais, é por uma razão estrutural : elas não nascem de conflitos de competência internos à consciência de um sujeito (que, por exemplo, sabendo o que deve fazer, não chega a querer fazê-lo — daí os sentimentos de “culpabilidade”, “vergonha”, “nojo de si”), mas do contato somático, direto ou à distância, com as qualidades concretas, estésicas, quer dizer, plásticas e dinâmicas, dos elementos constitutivos do mundo que o circunda — como quando se experimenta a forma física de desgosto que provoca o toque ou simplesmente a visão do viscoso26.

Esta clivagem entre duas acepções, dois regimes e, consequentemente, dois modos distintos de abordagem do “afetivo” (metatermo abrangente) — gramática modal do passional (ou patêmico) por um lado ; análise estésica do sensível propriamente dito, por outro — tem repercussões imediatas sobre a definição das problemáticas semióticas no campo político. A abordagem estésica se coloca explicitamente em ruptura com à visão logocêntrica subjacente ao conjunto dos enfoques que inicialmente passamos em revista (análise conceitual e ideológica, enunciativa e estratégica, e enfim patêmica). Sublinhemos, todavia, que não se trata para nós de substituir essas perspectivas por uma “nova” semiótica, pois cada uma destas problemáticas apresenta, em seu nível, sua própria relevância. Resta, no entanto, relativizar seu alcance.

26 Cf. as famosas páginas de J.-P. Sartre em L’être et le néant, Paris, Gallimard, 1947.

Os limites destas três problemáticas clássicas são aqueles da perspectiva juntiva que funda o esquema narrativo. No que tange à interação política, elas pressupõem como uma evidência a ideia de que nenhuma atitude de consentimento perante uma autoridade — a submissão, o respeito, a adesão, até mesmo a simpatia — poderia ser obtida fora da via do toma-lá-dá-cá. Ninguém daria poder a quem quer que seja a não ser em troca de alguma coisa, variando apenas a natureza do objeto a ser transmitido em função do tipo de interlocutor ao qual se dirige o ator em busca de poder. A alguns, seria necessário oferecer, no plano cognitivo (aquele da manipulação propriamente dita), seja razões claras e precisas para ter confiança na competência de um líder, seja argumentos bastante sólidos para resistir à prova da crítica ou da dúvida e, nesta medida, capazes de conquistar a adesão a um programa de ação27. A outros destinatários (ou aos mesmos, mas em outras circunstâncias), bastaria comunicar, no plano patêmico (aquele da manipulação afetiva), motivações que justifiquem o entusiasmo, a admiração, o apego perante uma personalidade ou, ao contrário, a indignação, a repulsa, a cólera, o ódio contra tal ou qual representante do partido adversário. E a alguns, enfim, bastaria oferecer, no plano puramente pragmático, pequenos ou grandes presentes, visto que existem contextos nos quais não há meio mais simples (senão mais seguro) que pagar para conseguir o voto desejado. Segundo este esquema bastante mecanicista, mas conforme a lógica juntiva, o destinatário começa por examinar o objeto proposto, avalia-o (é o “fazer interpretativo”), depois, em função do sentido e do valor que acha nele, decide se é pertinente ou não (“fazer decisional”) aderir à proposta e, por fim, passa ao ato, fazendo (ou não), no plano pragmático, o que se espera dele (“fazer executório”).

Segundo esta concepção quase behaviorista, a possibilidade — para o sujeito em posição de poder (ou que a este aspira) — de influenciar seus interlocutores (os eleitores, os cidadãos) é, portanto, condicionada por uma transferência de objetos. Em outras palavras, postula-se o caráter sempre objetalmente mediatizado da relação entre os sujeitos. A isso, a perspectiva estésica contrapõe o princípio de uma relação intersubjetiva não mediatizada, ou seja, sem transferência de objeto de valor. Com efeito, antes de trocar entre eles o que quer que seja, antes mesmo de se “comunicar” o menor objeto-mensagem articulado, os sujeitos de toda comunicação são, em diversos graus e conforme os tipos de situação, presentes um para o outro. Eles estão, de uma maneira ou de outra, estesicamente em relação, excepcionalmente pelo tato (os “mergulhos na multidão” com apertos de mão distribuídos como graças têm um papel apenas marginal), essencialmente pelo olhar, mas também pela voz, dimensão da presença sensível que durante muito tempo foi a principal no plano político, até que surgissem outros canais que se somaram àquele radiofônico. Tal contato pode se estabelecer tanto numa relação direta, face a face, como em um comício, quanto através desta forma de presença simulada, mas nem por isso menos eficaz, que as qualidades plásticas da imagem garantem em um cartaz ou em uma foto de imprensa e, a fortiori, frente à tela de televisão ou de computador.

27 Cf. as noções de “credibilità” e de “affidabilità” desenvolvidas por C. Vaccari em “Personalizzazione della politica, competenza del leader e negoziazione della fiducia”, in G. Cosenza (org.), Semiotica della comunicazione politica, Roma, Carocci, 2007 (especialmente, pp. 82-87).

Aquilo que então é convocado no receptor não é mais, ou não é ainda, sua competência cognitiva, nem mesmo volitiva. Antes de julgar os argumentos que lhe são expostos, ele percebe simplesmente diante dele, no outro, uma maneira de estar no mundo e, por isso mesmo, para o outro. Neste estágio um não diz ainda nada ao outro, nem mesmo quem ele é, mas expõe — dá a ver, ouvir, sentir através de sua dinâmica própria enquanto corpo-sujeito — a manifestação imediata (mesmo que fosse também, em parte, estrategicamente calculada como um simulacro) do que ele é, na imanência e no flagrante de seu estar-aí28.

28 Cf. V. Pisanty, “Churchill, M.L. King e Berlusconi”, in G. Cosenza (org.), Semiotica della comunicazione politica, op. cit. (especialmente, p. 202).

5. Da junção à união : o “suplemento” de sentido

Este aquém do discurso, esta outra maneira de fazer sentido (que não necessariamente substitui as estratégias discursivas sabiamente calculadas da persuasão, mas que constitui, no mínimo, sua música de fundo) depende, semioticamente falando, de uma lógica bem distinta daquela da junção : a lógica da união29. Ela passa pelo contágio estésico — por oposição à persuasão cognitiva — e dá lugar a um regime de sentido na interação muito preciso, o do ajustamento sensível, por oposição à manipulação patêmica. Um princípio geral de sensibilidade aí se substitui ou se superpõe ou, eventualmente, se combina ao princípio de intencionalidade que rege a semiótica da manipulação e das paixões. Daí a possibilidade de manipulações... por contágio. Se o reconhecimento deste regime coloca, entre semioticistas, alguns problemas, não é, ao que nos parece, porque alguma incompatibilidade no plano teórico seja obstáculo, mas antes porque o salto qualitativo a ser operado se choca com a forma do imaginário semiopolítico tradicionalmente dominante. Ao passar do discurso à presença em ato, passa-se, por assim dizer, do outro lado da narratividade, do lado de um regime de sentido no qual o Homo semioticus não mais se reconhece. E se compreende o porquê : algumas razões podem ser elencadas.

29 Cf. “Jonction versus Union”, Passions sans nom, op. cit., pp. 57-68.

Primeiramente, uma dificuldade terminológica. Este sentido abaixo do discursivo, como nomeá-lo ? Omar Calabrese chamou-o de “senso supplementare” (sentido suplementar), o que, certamente, no estado atual, não é a pior das fórmulas30. Pois isso é, pelo menos, admitir a existência de um componente “à parte”, sui generis, da significação, fundado na corporeidade do sensível, ao invés de, como geralmente acontece, reduzi-lo à gramática modal das paixões. Greimas, por sua parte, via nisso um “sentido segundo” que ele qualificava de “mítico”, por oposição às significações, consideradas “primeiras”, que veicula a figuratividade (enquanto distinta do “plástico”)31. Mas esta hierarquização pode ser invertida, como, aliás, ele mesmo sugere, colocando, a partir de outro ponto de vista, este sentido “segundo” como o “principal”. De fato, não é raro que o que vem como “suplemento” não seja o mais acessório. Em todo caso, no plano político, a partir do momento em que predomina a função espetacular, quer dizer, em que a presença prima sobre a representação (no sentido jurídico-político e semionarrativo de “delegação”), o estésico não pode prescindir de acompanhar o cognitivo, a menos que o supere.

30 O. Calabrese, La macchina della pittura. Pratiche teoriche della rappresentazione figurativa fra Rinascimento e Barocco, Bari, Laterza, 1985, p. 46.

31 A.J. Greimas, “Sémiotique figurative et sémiotique plastique”, Actes Sémiotiques-Documents, VI, 60, 1984, p. 12 et 24. E. Landowski, “Vinte anos depois. A propósito de ‘Semiótica figurativa e semiótica plástica’”, Com Greimas, op. cit.

Mas vem então esta objeção : ainda que haja uma dimensão que mereça atenção, como abordá-la ? Faltam instrumentos analíticos, declaram os céticos. Na realidade, a caixa de ferramentas está bem mais abastada do que eles imaginam. Para operacionalizar esta abordagem, a via foi aberta há muito por Jean-Marie Floch, cujo papel pioneiro no que concerne ao reconhecimento dos “formantes” da linguagem plástica não pode ser ignorado32. Além do eidético, do cromático e do topológico, resta ainda a elaborar as categorias requeridas de maneira mais ampla para dar conta dos efeitos de sentido que podem produzir, por exemplo, a cenografia de um grande espetáculo ou a simples gesticulação de um orador. Os componentes da plasticidade deveriam incluir elementos como a consistência material dos corpos em interação (sua leveza ou sua falta de graça, sua rigidez ou flexibilidade, tudo o que possa contribuir para seu brilho ou sobriedade, sua insipidez ou seu sabor etc.), bem como as determinações espaço-temporais de suas relações dinâmicas (orientação no espaço, velocidade, cadência de movimento, ritmo da elocução etc.). Esta é uma tarefa necessária para a qual, em princípio, não vemos nenhuma impossibilidade.

Resta enfim, último motivo de resistência contra as aberturas aqui propostas, uma razão que, no fundo, é de ordem política : como aceitar as implicações desta dimensão estésica ? Nem mais nem menos do que os esquemas construídos pela gramática narrativa clássica, a conceituação estésica tem implicações quanto à ideia que se pode fazer das relações de poder (e até mesmo, mais geralmente, do “sentido da vida”). Como já vimos, a sintaxe modal da manipulação pressupõe um sujeito competente para decidir sobre suas ações e, inclusive (por mais paradoxal que possa parecer), sobre suas paixões com base numa vontade consciente de si mesma e esclarecida pela Razão. A sintaxe do contágio o despoja disso tudo. Em uma conversa face a face, o nervosismo do interlocutor nos enerva, sua hilaridade nos faz rir, seu impulso nos arrebata, seu sorriso nos enternece. Emerge daí um regime interacional cujo princípio pode conduzir ao que se possa imaginar de melhor, mas também ao seu contrário. O melhor é a descoberta de um sentido “outro”, “segundo” (e principal, talvez), a ser apreendido na própria presença de outrem e das coisas, aquém das significações acordadas que se aprende geralmente a ler. Mas tornar-se disponível ao chamado deste sentido é ao mesmo tempo assumir o risco de entrar, pela via da relação estésica, no jogo de interações não mais intersubjetivas, propriamente falando, mas intersomáticas, frente às quais não se pode ter qualquer segurança.

32 Cf. J.-M. Floch, Petites mythologies de l’œil et de l’esprit. Pour une sémiotique plastique, Paris-Amsterdam, Hadès-Benjamins, 1985 ; Les formes de l’empreinte, Périgueux, Fanlac, 1986 ; Lecture de Tintin au Tibet, Paris, P.U.F., 1997. Igualmente J. Geninasca, “Le regard esthétique”, La parole littéraire, Paris, P.U.F., 1997 ; E. Landowski, “Modes de présence du visible”, Passions sans nom, op. cit.

Nesta perspectiva, aparece — coisa difícil de ser admitida do ponto de vista de uma semiótica canônica — uma figura de sujeito que não mais corresponde à imagem do Homo semioticus bem conformado, nem tampouco àquela do Homo politicus desenhado pelo cientista político clássico. Temos um exemplo extremo na Alemanha nazista onde a histeria de um ditador habilmente posto em cena conseguiu imprimir seu traço físico em cada uma de suas testemunhas até estremecer e reunir todo um povo, ou quase. Bem perto de nós, muitos líderes populistas sabem também jogar com esta fibra estésico-política e tirar partido de seu poder de enfeitiçamento33.

Diante disso, duas reações são possíveis. Uma consiste em decidir não ver. Quando uma realidade incomoda a boa ordem acadêmica por não se conformar com os esquemas aos quais parece mais confortável se ater, pode-se preferir dar prioridade ao cânone e ignorar o que forçaria seu questionamento. A reação oposta consiste em colocar as exigências vindas do objeto antes da preocupação em conservar inalterados os modelos já estabelecidos. Tem-se então que assumir o risco de inovar complexificando o aparelho conceitual de tal modo que possa integrar dimensões anteriormente ignoradas ou descrever aspectos mais sutis que o inicialmente previsto. Sempre foram os desafios postos pelo objeto que se pretende construir que levaram a avançar na conceptualização semiótica e a complexificar os modelos. Isso, obviamente, se aplica ao desenvolvimento da própria “socio”-semiótica.

33 Cf. Y. Fechine, “Uma dinâmica interacional complexa”, Acta Semiotica, 1, 2021 ; P. Demuru e F. Sedda, “Da cosa si riconosce il populismo. Ipotesi semiopolitiche”, Actes Sémiotiques, 121, 2018 ; E. Landowski, “Crítica semiótica do populismo”, Galáxia, 44, 2020.

O desafio, no caso, é o seguinte. No âmbito da política intervêm dois regimes interacionais que — seguindo nossas definições mais gerais (já consideradas por alguns, por assim dizer, “canônicas”) — se interdefinem opondo-se categoricamente um ao outro : por um lado, a manipulação com sua base cognitiva ; por outro, o contágio, de natureza sensível (enquanto base do ajustamento). Entretanto, o que constatamos ao observar a práxis política é que, na realidade, estes regimes não se excluem recíprocamente mas coexistem e, aparentemente, articulam-se um com o outro. De fato, temos um discurso essencialmente manipulatório que, porém, alicerça-se numa lógica do sensível. Aliás, do mesmo modo que aqui vemos o princípio sensível do ajustamento se combinar com o princípio intencional da manipulação, em um outro contexto, será a programação que veremos sutilmente se articular com a manipulação34.

Em que termos dar conta desta complexificação ? Em outros domínios da interação, a dinâmica das relações sensíveis entre os parceiros pode amiúde, e proveitosamente, apresentar-se como um fim em si, permitindo a cada um dos interagentes realizar-se ao desenvolver suas potencialidades graças ao processo de seu ajustamento sensível mútuo. Ao contrário, na política, em que a relação estésica intervém menos em processos recíprocos de criação de sentido e mais como um meio unilateral de captação, esta mesma dinâmica do sensível cumpre uma mera função de programa de uso a serviço de finalidades que dependem precisamente do outro regime, o da manipulação, no qual se articula o programa de base do dispositivo global : fazer aceitar uma dada proposta política ou, mais exatamente, fazer estesicamente aderir ao líder que a apresenta.

Consequentemente, parece tanto inaceitável reduzir a comunicação política à sua dimensão manipulatória, levando em conta apenas o cálculo das razões e das paixões, tanto quanto parece absurdo pretender que a sociedade seja reduzida doravante a uma espécie de campo magnético, a um “corpo” social contagiado pelo efeito de imagens, de poses, de gestos sem palavra construídos unicamente para impressionar uma população supostamente sem razão. Os dois tipos de processos, as duas sintaxes não cessam, na verdade, de se combinar. Alguns gostariam de poder decidir em termos simples e unívocos : cidadãos manipulados ou sociedade contagiada ? Não haveria muito sentido em responder categoricamente a esta pergunta. A comunicação política nunca deixou de se dirigir a sujeitos conduzidos por interesses e razões, o que os torna manipuláveis. E, no entanto, para fazer com que votem, adiram (ou pelo menos aceitem), nem sempre basta falar de interesses nem gerar paixões jogando com as razões que as suscitam. Isso quer dizer que o regime interacional da política é fundamentalmente híbrido : nele, a manipulação só opera passando por procedimentos que privilegiam o contágio, e reciprocamente o jogo com o sensível está a serviço dos interesses políticos. Analisar como se organizam e se transformam as relações entre estas distintas formas da interação política, é nossa tarefa.

34 Cf., no presente número, J.-P. Petitimbert, “La duplicité du nudge : une variante manipulatoire de la programmation”, Acta Semiotica, I, 2, 2021.

Conclusão : ligações políticas

Para dar conta da complexidade inerente a nosso objeto e ao mesmo tempo homogeneizar as pesquisas, falta um conceito abrangente e unificador. Do ponto de vista mais geral, a questão que nos ocupa concerne a diversidade dos modos como se adquire o poder e quais são os tipos de estratégias discursivas e cênicas que acompanham e, ao que parece, condicionam seu exercício. Nesta perspectiva, uma noção ainda não tematizada, pelo menos em nossa disciplina, pode servir de ponto de referência comum : a noção de ligação35.

Na base de quais princípios interacionais combinados e por quais procedimentos — ou mediante quais formas de “ligação” — governantes e governados (ou, mais geralmente, autoridades quaisquer em relação com seus subordinados) tomam, têm ou perdem, unilateralmente ou reciprocamente, influência e poder uns sobre os outros ? Em toda relação de poder de um ator sobre outro — quer ela se petrifique sob a forma assimétrica de uma pura dominação e de um predomínio irresistível, quer ela se estabilize numa relação hierárquica legitimada pelo consentimento da parte que se submete, ou ainda, quer ela flutue no modo de uma subordinação sustentada por laços afetivos tecidos entre parceiros — é preciso que haja, em um nível mais fundamental, algum princípio elementar de interdependência que coloque os interagentes virtualmente “em ligação” (“en prise”), que os “interligue” uns com os outros, antes mesmo que eles entrem em qualquer relação específica36.

36 Cf. Antes da interação, a ligação, op. cit., pp. 18-20.

35 Em francês, prise, palavra dificilmente traduzível em português. Cf. E. Landowski, “Avoir prise, donner prise”, Actes Sémiotiques, 112, 2009 ; tr. port. L. Silva, M. Scoz, Y. Fechine, Antes da interação, a ligação, São Paulo, CPS, 2019. A noção de “prise” é muito presente nas análises consagradas por Michel Foucault aos dispositivos e técnicas de poder. Cf., por exemplo, Sécurité, territoire, population. Cours au Collège de France (1977-1978), Paris, Gallimard-Seuil, 2004, particularmente p. 74 e 77.

A distintas formas de ligação correspondem regimes de relações diversificados no plano político. O que pode outorgar a uma autoridade a forma mais extrema de domínio (a prise ou o “estar em ligação” máxima) sobre os sujeitos é a aspiração deles mesmos — aspiração difusa ou proclamada, endêmica ou conjuntural — a um tipo de ordem e de segurança que, a seus olhos, resultaria de uma organização sociopolítica em que tudo sem exceção seria regulamentado e detalhadamente programado, e onde todos seriam mantidos sob controle : valorização desmedida de um princípio de regularidade que só pode levar a uma forma ou outra de totalitarismo. Por outro lado, o respeito geral ao princípio de uma intencionalidade tão racional e esclarecida quanto possível e compartilhada pelo maior número de cidadãos permite que estes se tratem reciprocamente como iguais e deleguem contratualmente o poder de decisão a representantes escolhidos conforme procedimentos de negociação de tipo democrático. Em contraste, para ser duradouro, o absolutismo do poder do autocrata que impõe seu arbítrio, seu “capricho”, pressupõe, da parte da população, uma forma de abulia ou de resignação frente à precariedade da vida, um consentimento mais ou menos fatalista à ordem das coisas, o princípio fundador sendo então aquele do assentimento diante do imprevisível e do incontrolável. Enfim, o que permite a um poder do tipo demagógico exercer seu domínio sobre as massas ao usar as fórmulas sedutoras do populismo é um princípio de sensibilidade capaz de colocar, por contágio estésico, o corpo social sob a dependência do corpo de um só, aquele do chefe, que se torna objeto de fascinação.

Raramente manifestados em estado puro, estes princípios diferenciadores de quatro grandes regimes de interação, ao atualizarem outras tantas formas de ligação entre interactantes, podem, como temos visto, intervir conjuntamente, em níveis diferentes de uma dada formação política. A própria semiótica narrativa clássica dá um exemplo de tal hibridação no plano da teoria. Vimos como ela oscila entre uma forma nobre de idealismo — a democracia — e um realismo sem ilusão — o mercado. No plano das práticas sociais, encontramos a mesma ambivalência : uma sociedade civil composta de sujeitos que determinam suas escolhas com base em confrontações políticas que dependem da manipulação (no melhor sentido do termo) e, ao mesmo tempo, uma sociedade mercantil cujo funcionamento, ancorado no bom desempenho do consumo, apoia-se numa comunicação publicitária onipresente, cujo poder de arregimentação decorre quase exclusivamente da eficácia estésica da imagem.

Mas a tendência global dá a impressão de que avançamos no sentido de um entrecruzamento destas variáveis. Na esfera propriamente comercial, o estilo da comunicação publicitária que se desenvolve na Internet parece assumir, no período mais recente, formas mais “participativas”, mais “interativas”, mais abertas ao raciocínio, numa palavra, mais manipulatórias ; logo, mais “políticas”, e neste sentido talvez até mais “democráticas” (sem, evidentemente, excluir derivações no sentido inverso) do que se observa em outros suportes, mais tradicionais. Paralelamente, ao contrário, a comunicação dos políticos parece cada vez mais simplista, mais oca discursivamente — e, portanto, demagógica — na medida mesma em que se reduz cada vez mais a procedimentos estésicos de sedução há muito tempo familiares aos publicitários, mas de um alcance ainda mais amplo pelo uso dos recursos digitais mais avançados.

Seria pura ilusão ignorar essas tendências pela simples razão que, no lugar da contemporânea demagogia de base estésica, preferiríamos um universo político mais em conformidade com os princípios democraticos que a clássica manipulação formaliza semioticamente. Quando a política muda, a maneira de dar conta dela também tem de evoluir. E por conseguinte, se nós, semioticistas, temos uma tarefa política a cumprir hoje, esta é, em primeiro lugar, levar a sério essa forma de ligação “olhos nos olhos” que funda a fascinação pelo líder e que sempre foi a força dos regimes autoritários.

 

Obras citadas

Barthes, Roland, Mythologies, Paris, Seuil, 1957.

Bertrand, Didier et al., Parler pour gagner. Sémiotique des discours de la campagne présidentielle de 2007, Paris, Presses de la FNSP, 2007.

Calabrese, Omar, La macchina della pittura. Pratiche teoriche della rappresentazione figurativa fra Rinascimento e Barocco, Bari, Laterza, 1985.

Calame, Claude, “Récit héroïque et pratique religieuse”, Annales, 61, 3, 2006.

Le récit en Grèce ancienne, Paris, Belin, 2000.

Dandolo, Gabriele, Politica ed esperienza. Il caso delle elezioni presidenziali francesi del 2007, tese, universidade de Bolonha, 2007.

Demuru, Paolo e Franciscu Sedda, “Da cosa si riconosce il populismo. Ipotesi semiopolitiche”, Actes Sémiotiques, 121, 2018.

Eco, Umberto, “Per una guerriglia semiologica”, in Il costume di casa. Evidenze e misteri dell’ideologia italiana, Milan, Bompiani, 1973.

Fechine, Yvana, “Uma dinâmica interacional complexa”, Acta Semiotica, I, 1, 2021.

Fiorin, Jose Luiz, As astúcias da enunciação. As categorias de pessoa, espaço e tempo, São Paulo, Contexto, 3ª ed., 2016.

Floch, Jean-Marie, Petites mythologies de l’œil et de l’esprit. Pour une sémiotique plastique, Paris-Amsterdam, Hadès-Benjamins, 1985.

Les formes de l’empreinte, Périgueux, Fanlac, 1986.

Lecture de Tintin au Tibet, Paris, P.U.F., 1997.

Foucault, Michel, Sécurité, territoire, population. Cours au Collège de France (1977-1978), Paris, Gallimard-Seuil, 2004.

Geninasca, Jacques, “Le regard esthétique”, La parole littéraire, Paris, P.U.F., 1997.

Greimas, Algirdas J., Sémantique structurale, Paris, Larousse, 1966 (reed., Paris, P.U.F., 2002) ; tr. port. Semântica estrutural, São Paulo, Cultrix / EDUSP, 1973.

— “De la modalisation de l’être”, Actes Sémiotiques-Bulletin, 9, 1979.

— “La soupe au pistou ou la construction d’un objet de valeur”, Du sens II, Paris, Seuil, 1983 ; tr. port. in Sobre o sentido II. Ensaios Semióticos, São Paulo, Edusp, 2014.

— “Sémiotique figurative et sémiotique plastique”, Actes Sémiotiques-Documents, VI, 60, 1984 ; tr. port. “Semiótica figurativa e semiótica plástica”, in A.C. de Oliveira (org.), Semiótica plástica, São Paulo, Hacker-CPS, 2004.

— e Joseph Courtés, Sémiotique. Dictionnaire raisonné de la théorie du langage, Paris, Hachette, 1979 ; tr. port. Dicionário de Semiótica, São Paulo, Contexto, 2008.

— e Jacques Fontanille, Sémiotique des passions, Paris, Seuil, 1991 ; tr. port. Semio?tica das paixo?es. Dos estados de coisas aos estados de alma, Sa?o Paulo, A?tica, 1993.

Habermas, Jürgen, “Au delà du libéralisme et du républicanisme, la démocratie délibérative”, Raison publique, 1, 10, 2003.

Jackson, Bernard, Making Sense in Law, Liverpool, Deborah Charles Publications, 1995.

Landowski, Eric, “Politiser, dépolitiser”, in J.-Cl. Coquet (org.), Sémiotique. L’Ecole de Paris, Paris, Hachette, 1982.

La Société réfléchie, Paris, Seuil, 1989 ; tr. port. A Sociedade refletida, São Paulo-Campinas, Educ-Pontes, 1992.

— “Viagem às nascentes do sentido”, in I. Assis Silva (org.), Corpo e Sentido, São Paulo, Edunesp, 1993.

— “Para uma abordagem sociossemiótica da literatura”, Significação, 11-12, 1996.

Présences de l’autre, Paris, P.U.F., 1997 ; tr port. Presenças do Outro, São Paulo, Perspectiva, 2002.

— “Estatuto e práticas do texto jurídico segundo uma perspectiva sociossemiótica”, Significação, 14, 2000.

Passions sans nom, Paris, P.U.F., 2004.

Les interactions risquées, Limoges, Pulim, 2005 ; tr. port. Interações arriscadas, São Paulo, Estação das Letras e Cores, 2014.

— “Unità del senso, pluralità di regimi”, in G. Marrone (org.), Narrazione ed esperienza. Intorno a una semiotica della vita quotidiana, Roma, Meltemi, 2007.

Avoir prise, donner prise, Actes Sémiotiques, 112, 2009 ; tr. port. L. Silva, M. Scoz, Y. Fechine, Antes da interação, a ligação, São Paulo, CPS, 2019.

Com Greimas, São Paulo, Estação das Letras e Cores, 2017.

— “Politiques de la sémiotique”, Rivista Italiana di Filosofia del Linguaggio, 13, 2, 2019.

— “Crítica semiótica do populismo”, Galáxia, 44, 2020.

Marsciani, Francesco, “I programmi elettorali. Un’analisi discorsiva”, in M. Livolsi e U. Volli (orgs.), La comunicazione politica tra prima e seconda repubblica, Milano, FrancoAngeli, 1995.

Petitimbert, Jean-Paul, “La duplicité du nudge : une variante manipulatoire de la programmation”, Acta Semiotica, I, 2, 2021.

Pezzini, Isabella, Lo spot elettorale, Roma, Meltemi, 2001.

Pisanty, Valentina, “Churchill, M.L. King e Berlusconi”, in G. Cosenza (org.), Semiotica della comunicazione politica, Roma, Carocci, 2007.

Quéré, Henri, “L’affiche électorale : positions et parcours”, Nouveaux Actes Sémiotiques, 2, 1989.

Rosanvallon, Pierre, La contre-démocratie. La politique à l’âge de la défiance,Paris, Seuil, 2006.

Sartre, Jean-Paul, L’être et le néant, Paris, Gallimard, 1947.

Urbain, Jean-Didier, “Idiologues et polylogues. Pour une sémiotique de l’énonciation”, Nouveaux Actes Sémiotiques, 14, 1991.

Vaccari, Cristian, “Personalizzazione della politica, competenza del leader e negoziazione della fiducia”, in G. Cosenza (org.), Semiotica della comunicazione politica, Roma, Carocci, 2007.

 


* Versão corrigida e atualizada (setembro de 2021) de “La politique revisitée : manipuler par contagion”, Versus, 107-108, 2008. Tradução de Emerson Xavier da Silva e Yvana Fechine com revisão do autor.

1 Sobre estes critérios, cf. E. Landowski, “Politiser, dépolitiser”, in J.-Cl. Coquet (org.), Sémiotique. L’Ecole de Paris, Paris, Hachette, 1982, pp. 153-156.

2 Cf. R. Barthes, Mythologies, Paris, Seuil, 1957; U. Eco, “Per una guerriglia semiologica”, in Il costume di casa. Evidenze e misteri dell’ideologia italiana, Milan, Bompiani, 1973.

3 Cf. por exemplo F. Marsciani, “I programmi elettorali. Un’analisi discorsiva », in M. Livolsi et U. Volli (éds.), La comunicazione politica tra prima e seconda repubblica, Milano, FrancoAngeli, 1995 ; J.-D. Urbain, “Idiologues et polylogues. Pour une sémiotique de l’énonciation”, Nouveaux Actes Sémiotiques, 14, 1991.

4 Cf. D. Bertrand et al., Parler pour gagner. Sémiotique des discours de la campagne présidentielle de 2007, Paris, Presses de la FNSP, 2007 (cap. 5, “La mobilisation des passions”).

5 Cf. E. Landowski, “Viagem às nascentes do sentido”, in I. Assis Silva (org.), Corpo e Sentido, São Paulo, Edunesp, 1993 ; “Régimes de présence et formes de popularité”, Présences de l’autre, Paris, P.U.F., 1997 ; “En deçà ou au-delà des stratégies, la présence contagieuse”, Passions sans nom, Paris, PUF, 2004.

6 Ver por exemplo H. Quéré, “L’affiche électorale : positions et parcours”, Nouveaux Actes Sémiotiques, 2, 1989 ; I. Pezzini, Lo spot elettorale, Rome, Meltemi, 2001.

7 Sobre o campo religioso e mítico, Cl. Calame, “Récit héroïque et pratique religieuse”, Annales, 61, 3, 2006. Sobre o campo literário, Cl. Calame, Le récit en Grèce ancienne, Paris, Belin, 2000 ; E. Landowski, “Para uma abordagem sociossemiótica da literatura”, Significação, 11-12, 1996. Sobre o campo jurídico, B.S. Jackson, Making Sense in Law, Liverpool, Deborah Charles Publications, 1995 ; E. Landowski, “Une approche sémiotique et narrative du droit”, La Société réfléchie, Paris, Seuil, 1989 ; id., “Estatuto e práticas do texto jurídico segundo uma perspectiva sociossemiótica”, Significação, 14, 2000.

8 Cf. E. Landowski, “Pour une sémiotique des situations”, Présences de l’autre, op. cit. ; “Textes et pratiques”, Passions sans nom, op. cit.

9 Cf. E. Landowski, “Politiques de la sémiotique”, Rivista Italiana di Filosofia del Linguaggio, 13, 2, 2019.

10 Cf. Sémantique structurale, Paris, Larousse, 1966 (reed., Paris, PUF, 2002), particularmente pp. 102, 117 et 172-186. Cf. também E. Landowski, “A borboleta cabeça-de-Janus. A propósito de Semântica estrutural”, in Com Greimas, São Paulo, Estação das Letras e Cores, 2017.

11 Cf. A.J. Greimas e J. Courtés, Sémiotique. Dictionnaire raisonné de la théorie du langage, Paris, Hachette, 1979, p. 247.

12 Sobre a “manipulação” como fundamento do laço social, cf. E. Landowski, Les interactions risquées, Limoges, Pulim, 2005, pp. 83-85.

13 “La soupe au pistou ou la construction d’un objet de valeur”, Du sens II, Paris, Seuil, 1983, p. 169.

14 Sobre os distintos modos de aquisição do objeto, cf. E. Landowski, “Politiques de la sémiotique”, art. cit.

15 Cf. “Politiques de la sémiotique”, art. cit.

16 Fórmula tomada livremente emprestada de Pierre Bourdieu.

17 Cf. por exemplo J. Habermas, “Au delà du libéralisme et du républicanisme, la démocratie délibérative”, Raison publique, 1, 10, 2003.

18 Sobre “narração” e “experiência” enquanto formas semióticas do estar-no-mundo, cf. E. Landowski, “Unità del senso, pluralità di regimi”, in G. Marrone (org.), Narrazione ed esperienza. Intorno a una semiotica della vita quotidiana, Roma, Meltemi, 2007.

19 Cf. J.L. Fiorin, As astúcias da enunciação. As categorias de pessoa, espaço e tempo, São Paulo, Contexto, 1996.

20 Para uma análise semiótica deste debate em termos de “estesia social”, cf. G. Dandolo, Politica ed esperienza. Il caso delle elezioni presidenziali francesi del 2007, tese, Universidade de Bolonha, 2007.

21 Ao contrário, tédio e desconfiança estão no âmago das preocupações dos cientistas políticos, para quem o desencantamento encontra-se na raiz da “crise da política” contemporânea. Cf. P. Rosanvallon, La contre-démocratie. La politique à l’âge de la défiance, Paris, Seuil, 2006.

22 Cf. “La vedette et le bouffon”, Présences de l’autre, op. cit. ; “Diana, in vivo”, Passions sans nom, op. cit.

23 A.J. Greimas e J. Fontanille, Sémiotique des passions, Paris, Seuil, 1991.

24 Cf. A.J. Greimas, “De la modalisation de l’être”, Actes Sémiotiques-Bulletin, 9, 1979 (agora in Du sens II).

25 Cf. Sémiotique des passions, op. cit., p. 66, 85, 170, 175, 179, 180, 265, 270-272 (conforme o índice do volume original em francês).

26 Cf. as famosas páginas de J.-P. Sartre em L’être et le néant, Paris, Gallimard, 1947.

27Cf. as noções de “credibilità” e de “affidabilità” desenvolvidas por C. Vaccari em “Personalizzazione della politica, competenza del leader e negoziazione della fiducia”, in G. Cosenza (org.), Semiotica della comunicazione politica, Roma, Carocci, 2007 (especialmente, pp. 82-87).

28 Cf. V. Pisanty, “Churchill, M.L. King e Berlusconi”, in G. Cosenza (org.), Semiotica della comunicazione politica, op. cit. (especialmente, p. 202).

29 Cf. “Jonction versus Union”, Passions sans nom, op. cit., pp. 57-68.

30 O. Calabrese, La macchina della pittura. Pratiche teoriche della rappresentazione figurativa fra Rinascimento e Barocco, Bari, Laterza, 1985, p. 46.

31 A.J. Greimas, “Sémiotique figurative et sémiotique plastique”, Actes Sémiotiques-Documents, VI, 60, 1984, p. 12 et 24. E. Landowski, “Vinte anos depois. A propósito de ‘Semiótica figurativa e semiótica plástica’”, Com Greimas, op. cit.

32 Cf. J.-M. Floch, Petites mythologies de l’œil et de l’esprit. Pour une sémiotique plastique, Paris-Amsterdam, Hadès-Benjamins, 1985 ; Les formes de l’empreinte, Périgueux, Fanlac, 1986 ; Lecture de Tintin au Tibet, Paris, P.U.F., 1997. Igualmente J. Geninasca, “Le regard esthétique”, La parole littéraire, Paris, P.U.F., 1997 ; E. Landowski, “Modes de présence du visible”, Passions sans nom, op. cit.

33 Cf. Y. Fechine, “Uma dinâmica interacional complexa”, Acta Semiotica, 1, 2021 ; P. Demuru e F. Sedda, “Da cosa si riconosce il populismo. Ipotesi semiopolitiche”, Actes Sémiotiques, 121, 2018 ; E. Landowski, “Crítica semiótica do populismo”, Galáxia, 44, 2020.

34 Cf., no presente número, J.-P. Petitimbert, “La duplicité du nudge : une variante manipulatoire de la programmation”, Acta Semiotica, I, 2, 2021.

35 Em francês, prise, palavra dificilmente traduzível em português. Cf. E. Landowski, “Avoir prise, donner prise”, Actes Sémiotiques, 112, 2009 ; tr. port. L. Silva, M. Scoz, Y. Fechine, Antes da interação, a ligação, São Paulo, CPS, 2019. A noção de “prise” é muito presente nas análises consagradas por Michel Foucault aos dispositivos e técnicas de poder. Cf., por exemplo, Sécurité, territoire, population. Cours au Collège de France (1977-1978), Paris, Gallimard-Seuil, 2004, particularmente p. 74 e 77.

36 Cf. Antes da interação, a ligação, op. cit., pp. 18-20.

 

______________

Mots clefs : contagio, esquema narrativo, homo semiopoliticus, política vs político, ligação (prise), sensível (vs passional).

Auteurs cités : Omar Calabrese, Claude Calame, Paolo Demuru, Yvana Fechine, Jose Luiz Fiorin, Jean-Marie Floch, Michel Foucault, Jacques Geninasca, Algirdas J. Greimas, Jean-Paul Petitimbert, Pierre Rosanvallon, Franciscu Sedda.


Plan :

Introdução : revisitar, rever, reorientar

1. O político, a política — e retorno

2. Esquema narrativo : a Polis, o Mercado

3. O que falar quer dizer : sob o blablablá, a presença

4. Aquém da aritmética das paixões, a dinâmica do sensível

5. Da junção à união : o “suplemento” de sentido

Conclusão : ligações políticas

 

Pour citer ce document, choisir le format de citation : APA / ABNT Vancouver

 

Recebido em 27/12/2020. / Aceito em 16/10/2021.